De uma foto...
conta como é,
descrevo um quarto,
conta o gosto do vinho,
toca Charlie Parker,
escuto Billie com a flor branca no cabelo,
conta como é,
a tua lembrança de um cheiro,
ou um jeito de olhar.
ri devagar,
fala com esse jeito de beira de mar,
o que é bonito,
como é pescar,
te conto das ondinas
e da minha pele branca
da vontade de fugir para uma ilha
e andar descalça na areia
ouvindo algo tranquilo
longe de tudo que fatalmente se despedaça
na mão de gente estranha ou bruta.
conto do biscoito suíço
que coloco em cima do chá e amolece
tem doce de leite por dentro,
faz cócegas na língua.
me conta o que eles te pedem,
o que vc procura quando anda nas ruas
se vc se sente mais livre porque mais desconhecido
porque um viajante.
conto do sol que bate na janela,
o frio absurdo do ar condicionado,
das minhas fugas noturnas,
das minhas palavras favoritas
e invento histórias para que ele sonhe
sozinho do outro lado do oceano.
sou um pouco menino, ás vezes
conto dos quebrados, das janelas puladas
ele canta ao fundo das músicas para enredar
meus sentidos,
e me chama, sacanamente, tarde da noite,
não prometemos,
não juramos,
não suspiramos,
nenhum truque na manga,
nenhum olhar de canto,
apenas eu, ele e, no meio, o oceano.