"Que seja doce."(CFA)

quarta-feira, setembro 27, 2006

Ficar só

precisar ficar só.
dar-se ao direito de ficar só.
isolar-se.
desmarcar compromissos.
ah, coração, não fique triste,
eu volto para casa quando o ruído diminuir,
quando a cabeça fizer sentido,
quando a alma não quiser saltar do corpo
e ir sabe-se lá para onde.

encontrar abrigo.
calma.
sossego.
poder olhar o vento nas ondas
e ouvir.
ouvir o que o ruído não deixa.
(qual deles? não importa, não importa)

do outro lado da cidade, coração
onde a chuva chega mais tarde
acordei pensando em vc
no jeito que vc me abraça

eu estava tão certa, coração
atravessei a cidade,
a chuva,
sujei a barra da calça jeans,
molhei minhas botas,
bati a porta da tua casa
só pra dizer
que podemos tudo
sempre podemos tudo
mesmo sozinhos
e somos muito livres (embora não saibamos muito bem como)
para escolhermos quem nos acompanha no caminho.

no longe,
as respostas ainda incompletas,
a cabeça mais serena
compreendi,
quero ser livre
só posso ser livre
e tenho sonhos demais.

sexta-feira, setembro 22, 2006

Ombro

"amor, eu sinto a sua falta
e a falta é a morte da esperança" (Por onde andei, Nando Reis)

o que dói quando procuro teu ombro,
o que dói,
não sei mais.
eu finjo não saber.
não sentir os olhos ardendo.
não sentir a boca secando.
finjo procurar alguma coisa importante na bolsa.
trabalhar compenetradamente.
mas arranha.
arranha.
e o gosto amargo não deixa conversar.
meu sorriso quebrado não convence.
meus olhos embaçam fácil quando dentro fora do lugar.
mais fora do lugar do que de costume.

vc não entende, nem poderia.
e certas escolhas não se pedem.
nem são impostas.
existem lugares que precisamos andar sozinhos.
eu não sabia.
pensei que...
mas de pensar que... não adianta.
ninguém tem culpa.

Das tantas mortes

coisas morrem todos os dias.
na minha frente.
vc repara?
acordam-me madrugada adentro, fantasmas mudos.
não me dizem nada, não fazem sinal, apenas permanecem perto,
comungando da minha solidão.
ás três da manhã, o mundo é extraordinário e venta forte.
ás quatro, o quarto é o lugar mais solitário do mundo.
um soluço seco e a falta de ponto de apoio me fazem buscar a voz dele.
acordado de um sonho qualquer, saber que em algum lugar ele está e me espera.
ou não me espera.
mas me ama.
com certeza, me ama.
vontade de dizer: me busca, como nos tempos da escola, quando ficava febril.
mas não posso.
o tempo passa.
e aprendemos a sair das febres, a doer no calado.

ás três da manhã, alguém se incomoda e fecha todas as janelas.
mas o vento é como eu.
ele se fragmenta, ele muda, se transforma e passa entre vãos desconhecidos,
faz barulho, dá sua presença.
o vento me faz sorrir ás três da manhã,
quando o mundo é um lugar completamente novo
apesar de muito muito muito muito muito velho o coração do homem.

eu olho pra baixo, ás vezes.
olho para trás, ás vezes.
para ver quantas foram e quantas ainda faltam.
quantas.
tantas.
o costume de morrer sempre e acordar amanhã.
morrer para saber acordar amanhã com olhos limpos.
a cantiga no fundo, estilhaça, "marinheiro só"
sempre sempre sempre o navio,
no longe, a voz do homem.
perto, ninguém,
ás três da manhã, todos os milagres acontecem longe dos olhos do homem
tendo o vento como testemunha.
vc me faz sangrar quando e onde já sangrei demais.
e deixa um oco no peito.
um oco.
um eco.
é só mais uma morte, ela diria, naturalmente distante.
só mais uma,
mas estou tão cansada,
que se perdem as palavras
se perde o sentido
e de repente,
não há mais nada.
nada.
um oco.
um eco.
e ninguém a velar o morto.
nenhuma luz acesa no caminho.

sexta-feira, setembro 15, 2006

Cansaço

"Scar tissue that I wish you saw
Sarcastic mister know it all
Close your eyes and I'll kiss you 'cause
With the birds I'll share
With the birds I'll share
This lonely view
With the birds I'll share
This lonely view" (trecho de Scar Tissue, Red Hot Chili Peppers)

porque existem dias em que vc simplesmente não.
assim mesmo, não.
e outro devia ficar no seu lugar, só para te poupar tanto esforço.
penso que alguém devia ser gigante e gentil o bastante para me pegar nos braços e me levar para casa. só isso: me levar pra casa.

quinta-feira, setembro 14, 2006

Provocação

são certas noites.
não todas.
uma vontade, uma provocação dos sentidos
uma febre
um arrepio na nuca.

são certas noites.
vc não está aqui.
eu não tenho respostas.
e trago todas as urgências.
o gosto que não entendo,
a cor no fundo do copo
o corpo e as mãos e os gestos
provocação dos sentidos
não querer voltar para casa
para pensar olhando para o teto
em tudo que ainda dói quando decide doer
em tudo que arranha quando decide machucar
e um cansaço de dizer e fazer as coisas esperadas e certas.

são certas, as noites como esta.
são certas noites como esta, meu amor.
quando vc está longe
e me diz doces palavras
que não fazem efeito
que não deixo fazerem efeito
que não permito entrada
eu, tão feita a toda gentileza que é tua
eu, que ainda me debato e grito e berro e danço
provocação dos sentidos.
provocação, meu amor, será que vc entende?

eu nunca poderia ser livre
eu nunca conseguiria ser livre
porque toda a liberdade que eu consigo não pode
nem deve
ser explicada
escrita
mensurada
esmiuçada
porque cercada de meus mistérios particulares
e se vc soubesse todos eles,
eu seria apenas alguém
ou mais alguém que vc amaria a confusão,
o erro,
o mal-entendido
e se compadeceria.
como vc sempre faz.

e eu quero que vc me deseje
que me ame
que me entenda
mas nunca nunca se compadeça.
eu, cruamente honesta
sempre te testando com a verdade
provocação dos sentidos
em certas noites como esta,
são certas, as noites como esta, meu amor
que devo trancar portas e janelas.
devo apagar todas as luzes
fingir dormir o sono dos muitos puros
rezar
não sucumbir ao arrepio na nuca
ao uivo
ao impulso de saltar
no escuro
sempre no escuro.

Vinho


"E assim é que através desse terrestre solo,
O vinho é ouro a rolar, fascinante Pactolo;
Pela garganta humana ele canta os seus feitos
E reina por seus dons como os reis mais perfeitos.

E para o ódio afogar e embalar o ócio imenso
Desta velhice atroz que assim morre em silêncio ,
Gerou o sono, Deus, de remorso tocado;
O homem o vinho criou, filho do sol sagrado" (trecho Vinho dos Trapeiros, Baudelaire)

pelo almoço e pelo vinho.
todo dia devia ser quinta feira.

quarta-feira, setembro 06, 2006

Deusa

a apresentação absurda dessa mulher no VMAS (clique e assista no youtube)
(para quem faz dança do ventre e sabe como é difícil cada movimento, ela ainda conseguiu um mix com dança indiana e ficou sensacional)
PS: yeah, eu amo Shakira.

terça-feira, setembro 05, 2006

Frio- Heat of your light (Juliette & the Licks)

"I'd come around like a little cat/ Brush past your leg imagine that/ Don't leave my dish outside/ I want to eat by the heat of your light."

bebo coca light quente. vc liga tarde. durmo em turnos. me aborreci hoje com um cara. um problema territorial. demarcar espaços e mantê-los, qualquer coisa assim. nada digno de nota.
sinto frio, por isso caminho nos corredores, ouvindo música.
tenho tentado, vc sabe. tenho tentado tanto. ás vezes, parece tão tarde. mas é impressão apenas.
quase uma da manhã. queria sua camisa marrom que esqueci na casa dos meus pais.
queria sua mão no meu cabelo, brincando com os cachos curtos. não sou muito diferente, juro. não tanto assim.
estou mentindo para vc enquanto vc dorme. é mais fácil.
vc se apavora quando choro, como quando naquela manhã de domingo. lembro do seu rosto indignado porque discutíamos quando o telefone tocou. vc viu minha voz falhando ao final da ligação e como encolhi até ser um bicho quase invisível. vc esquece tudo e me toca. dói quando vc me toca. porque minha dor não está sozinha comigo, ela parece estranhamente te pertencer. isso me envergonha por dois segundos mas dói tanto e vc me toca como se tivesse acabado de cair e me machucar.
companhia para dor. não, eu não sabia. mas vc quer tudo, não quer? no matter what, vc ainda quer tudo.
bebo coca light quente. lembro de apertar sua mão no final do filme. um final feliz e o cinema lotado suspirando. ainda queremos tanto assim? ainda podemos ser salvos?
se ainda ansiamos tanto para que as histórias que nos contam terminem bem, então ainda podemos acreditar.
monto uma casa embaixo do edredom, feita de lençóis e travesseiros. vc sempre está lá.
de alguma forma, sempre está lá. com todas as coisas que amo e penso. com todas as pessoas que amo e penso. com tudo que amo e penso....e o frio passa.
e se for mesmo para sempre?
"come rock me to sleep by the heat of your light"