"Que seja doce."(CFA)

sexta-feira, julho 15, 2005

Sopro

(*ouvindo O, Damien Rice)

Alguma coisa se move no escuro. Alguma coisa se espreguiça quando a luz do sol reflete no muro de tijolos vermelhos do lado de fora. Um pouco do seu cheiro fica no travesseiro embora você nunca se deite comigo naqueles lençóis ásperos. Imagino. Nada demais, nada que possa descrever quando todos dormem. Além dos meus olhos, outros olhos de vidro observam além da parede e fico doente demais. Escrevo cartas como quem não sabe mais contar as mesmas velhas histórias que empoeiram até desaparecerem no canto do quarto.

Tenho saudade de quando podia chegar e bater palmas na porta dessa casa, mas o Tempo tem dessas, não há nada a fazer senão enxugar as palmas vazias e sorrir quebrado para quem passa. Vai tudo bem ou ficamos combinados assim. Um desastre é só mais um desastre, existe uma outra saída no fundo daquele baú de madeira pesada que cismam em guardar meus antigos escritos. Há um caminho sem pegadas de gente, onde os barulhos não são deste mundo e por isso mesmo, devem acalmar meu sono inquieto.

Este rosto que adoro, tem curvas duras escondendo uma carne macia e uma vontade tão doce.....algo que por mais que suba e tente enxergar distante, não vejo final. Fica sempre mais um pouco quando você se despede, como um resto de calma na garganta, um pouco de silêncio no peito e meus pés me guiam até a porta de casa, como se meu corpo fosse um cavalo acostumado.

Não me perturbe, Sombra, não me perturbe. Sei dos fins, das rupturas, das mentiras, das falsas promessas, vamos lá, passei por solavancos na estrada antes de chegar até aqui. Mesmo assim, Sombra, você tenta me entender com seus vazios e nada, absolutamente nada me explica, eu sei, nada me estabelece, apenas uma força teimosa de continuar e ser, a tal coisa certa que muitos nem sabem como, quero e faço, por mais difícil que pareça, sempre será mais penoso tentar enganar e sangrar ruim como qualquer destino ordinário, mas me deixe, Sombra, não me acorde tarde da noite, amargando minha boca, tecendo tramas para envenenar minha pele, toda essa força para provocar meu avesso tão inútil, eu não tenho medo porque sei da minha morte possível em todas as quedas e quantas meninas são necessárias para o sacrifício de estar lúcida.

Distante, ainda ouço a música. Não se assuste se um dia me recusar a cantar em seu ouvido. Alguma coisa em você é tão tranquila e certa de si mesma, alguma coisa em você me pacifica, faz com que feche todas as portas e escancare as janelas para o novo que não faço idéia, eu sonho agora entre os minutos que você conta o seu dia e faço planos, como quem desaprendeu a se encolher quando toca as cicatrizes.