Chuva, pesadelos, fome ou qualquer coisa assim
"i just want stay right here until never dawns" ( Corinne Bailey Rae)
uma da manhã.
mais uma vez.
a chuva faz barulho nas janelas.
meninas conversam nos quartos.
escrevo no escuro com a luz do banheiro acesa.
não transcrevo absolutamente nada.
alguém achou bonito.
falava de segunda, da nossa briga boba.
seu mau humor de manhã e meu jeito de te chamar de criança.
"moleque", assim rosnando.
sou menino demais.
estou com fome.
queria beber sangria.
comer as frutas com o dedo no fundo do copo.
e rindo.
vc sempre me olha como se tivesse seis anos de idade (eu , não vc).
sinto sua falta, quase sempre de madrugada, quando acordo.
o segundo travesseiro não me diz para voltar para cama, como vc faz.
ele não me beija a testa quando me abraça involuntariamente durante a noite.
desde quando nos abraçamos enquanto dormimos assim, sem necessariamente estarmos conscientes?
cheiro de pão quente.
tenho medo. quase sempre. uma angústia absurda de estar lá na frente, ver tudo e falar pra mim mesma que tudo dará certo, tudo está bem, estamos todos salvos.
tenho umas cicatrizes estranhas.
elas doem com a mudança de tempo.
e não consigo fazer com que desapareçam.
quem nos faz mal nos transforma tanto ou mais quanto quem nos faz bem.
talvez mais.
tenho medo de ser nociva, vc sabe.
como foram.
antes.
bem antes.
antes da estrela,
antes da sua mão,
antes.
um tempo onde as mentiras pareciam perfeitas quando escutava, embora não fossem minhas.
nem os pecados.
mas vc me diz que não, eu nunca poderia fazer mal a ninguém que não fosse eu mesma.
acho engraçado, vc acha perigoso.
porque sabe o que isso quer dizer.
quanto tempo demora ainda, meu bem?
fecho os olhos para imaginar vc dormindo, sua pele, seu cheiro,
vc roubando o edredom ou o travesseiro.
enorme falta de casa.
de porto.
do cheiro do familiar, de quem se ama.
colo de mãe, beijo de boa noite do pai.
o barulho dos cavalos nas baias.
os cachorros latindo.
queria um som que me norteasse.
que me desse paz para dormir de novo.
uma promessa.
de tentar tudo de novo.
amanhã.
<< Home