Tiro
“De tanto levar, frechada do teu olhar, meu peito até parece sabe o que???Táubua de tiro ao Álvaro, num tem mais onde furar” (Adoniran Barbosa, na voz de Elis)
Começa, tanto faz quem pensou primeiro, começa, parece uma daquelas cenas longas, onde uma coisa toca a outra, uma coisa derruba a outra, que derruba uma terceira e assim por diante. Assim, começa, você pensa que alguém poderia premeditar, mas não se trata disso, aparenta ser um jogo, quando na verdade, não pode ser considerado assim, desse modo, você concluiria que, não faz sentido usar uma palavra encaixotada desse jeito para algo que se resume ao meu desespero ou minha fome ou apenas essa vontade de saber se ainda consigo sentir alguma coisa além do amargo .
Então, brindamos, brindamos todos, acendemos cigarros que servem apenas para mascarar nosso verdadeiro cheiro e machucar nossas gargantas e olho este rosto tão de perto que consigo ver os poros, mas vou me desconcentrando e apenas acompanho o ritmo da voz do estranho. Vou como que se estivesse perdido entre correntezas, como tentando apenas sobreviver a elas, não me debato apenas abandono meu corpo na cadência da maré, torcendo para que alcance alguma praia antes da exaustão completa. Falo alguma coisa, canto um trecho de canção, olhando e sorrindo, tão perto, que o estranho se surpreende, sorri, parece uma criança, parece ter carne macia, começo a pensar como uma fera há muito enjaulada e que, de súbito, escapa. Sei que o estranho tem um nome, sei que pergunto sua idade apenas para confirmar o que vejo nas poucas marcas ao redor dos olhos, a fera começa a salivar ao sentir a promessa de sangue fresco, meu corpo esquenta, presto atenção na dança cada vez mais certa, cada vez mais exata que se faz sem qualquer ensaio, me emociono sabendo da fugacidade, do brilho vagabundo desses instantes.
Seguro sua mão com força, ele parece inofensivo, indefeso, tenho quase pena, quase, mas não a ponto de parar, pensar melhor se devo ou não, não sou tão ridículo, tomo este estranho pela mão e ultrapasso a porta daquele quarto, sabendo que não é um quarto, mas finjo que sim, abro a cortina como se soubesse o que há por trás dela, mesmo que ignore o que há, o estranho acredita que sei porque não oferece qualquer resistência, apenas segue, apenas me dá a mão como se confiasse que guiarei seus passos com cuidado. Mas não é cuidado que me faz morder a boca do estranho, e colocar minhas mãos em seu rosto e olhá-lo com a crueza de uma fera que estuda a presa, que luta com ela, que espera que ela se debata e esquente o vinho quente das veias, é assim que seguro o rosto deste estranho, para guardar este desejo débil que sinto, esse prazer animal de subjugar. Engano-me, isto não é um jogo, não é um sacrifício, não é aparentemente nada que me faça acordar amanhã com alguma sensação redentora, não, somente um desafio lançado a mim mesmo, jogo de espelhos.
O estranho morde a boca quando aproximo meu rosto ao dele, sinto seu coração batendo mais rápido quando coloco minha mão de leve em seu peito. Minha vista turva quando ele obedientemente abre sua boca e recebe minha língua, seguro seus quadris com força, penso em humilhações, em sadismos, sinto náusea e isso me acende mais a vontade, páro este beijo que nada tem de romance, que apenas é demonstração de poder, sei que ele não oferece resistência ao meu comando, mordo seu queixo, seu pescoço, penso em leões devorando gazelas, em crocodilos e suas mandíbulas, nas fileiras de dentes dos tubarões, meu gozo é este, é o gozo do mais forte. É assim que o afasto depois que me satisfaço, vejo-o fechar a braguilha da calça jeans e me olhar como quem tenta entender e não consegue, como quem precisa dizer algo e não encontra palavra.
Começa, tanto faz quem pensou primeiro, começa, parece uma daquelas cenas longas, onde uma coisa toca a outra, uma coisa derruba a outra, que derruba uma terceira e assim por diante. Assim, começa, você pensa que alguém poderia premeditar, mas não se trata disso, aparenta ser um jogo, quando na verdade, não pode ser considerado assim, desse modo, você concluiria que, não faz sentido usar uma palavra encaixotada desse jeito para algo que se resume ao meu desespero ou minha fome ou apenas essa vontade de saber se ainda consigo sentir alguma coisa além do amargo .
Então, brindamos, brindamos todos, acendemos cigarros que servem apenas para mascarar nosso verdadeiro cheiro e machucar nossas gargantas e olho este rosto tão de perto que consigo ver os poros, mas vou me desconcentrando e apenas acompanho o ritmo da voz do estranho. Vou como que se estivesse perdido entre correntezas, como tentando apenas sobreviver a elas, não me debato apenas abandono meu corpo na cadência da maré, torcendo para que alcance alguma praia antes da exaustão completa. Falo alguma coisa, canto um trecho de canção, olhando e sorrindo, tão perto, que o estranho se surpreende, sorri, parece uma criança, parece ter carne macia, começo a pensar como uma fera há muito enjaulada e que, de súbito, escapa. Sei que o estranho tem um nome, sei que pergunto sua idade apenas para confirmar o que vejo nas poucas marcas ao redor dos olhos, a fera começa a salivar ao sentir a promessa de sangue fresco, meu corpo esquenta, presto atenção na dança cada vez mais certa, cada vez mais exata que se faz sem qualquer ensaio, me emociono sabendo da fugacidade, do brilho vagabundo desses instantes.
Seguro sua mão com força, ele parece inofensivo, indefeso, tenho quase pena, quase, mas não a ponto de parar, pensar melhor se devo ou não, não sou tão ridículo, tomo este estranho pela mão e ultrapasso a porta daquele quarto, sabendo que não é um quarto, mas finjo que sim, abro a cortina como se soubesse o que há por trás dela, mesmo que ignore o que há, o estranho acredita que sei porque não oferece qualquer resistência, apenas segue, apenas me dá a mão como se confiasse que guiarei seus passos com cuidado. Mas não é cuidado que me faz morder a boca do estranho, e colocar minhas mãos em seu rosto e olhá-lo com a crueza de uma fera que estuda a presa, que luta com ela, que espera que ela se debata e esquente o vinho quente das veias, é assim que seguro o rosto deste estranho, para guardar este desejo débil que sinto, esse prazer animal de subjugar. Engano-me, isto não é um jogo, não é um sacrifício, não é aparentemente nada que me faça acordar amanhã com alguma sensação redentora, não, somente um desafio lançado a mim mesmo, jogo de espelhos.
O estranho morde a boca quando aproximo meu rosto ao dele, sinto seu coração batendo mais rápido quando coloco minha mão de leve em seu peito. Minha vista turva quando ele obedientemente abre sua boca e recebe minha língua, seguro seus quadris com força, penso em humilhações, em sadismos, sinto náusea e isso me acende mais a vontade, páro este beijo que nada tem de romance, que apenas é demonstração de poder, sei que ele não oferece resistência ao meu comando, mordo seu queixo, seu pescoço, penso em leões devorando gazelas, em crocodilos e suas mandíbulas, nas fileiras de dentes dos tubarões, meu gozo é este, é o gozo do mais forte. É assim que o afasto depois que me satisfaço, vejo-o fechar a braguilha da calça jeans e me olhar como quem tenta entender e não consegue, como quem precisa dizer algo e não encontra palavra.
Anoto o número do telefone em um guardanapo com minha letra limpa, estendo ao estranho como uma bandeira perigosamente branca, que ele aceita como parte do ritual. Não me importo como voltará para casa, não me interessa que tenha uma casa, mãe, um cachorro, pergunto sua idade por parecer muito tarde apenas, amanhece, sinto um gasto em mim que me desanima de continuar qualquer conversa. Despeço-me, confiro os trocados nos bolsos e ando para casa com a cabeça ainda confusa de álcool e desejo. Ainda estou vivo, tanto faz.
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